Por: Antonio Carlos Prado*
O ministro Luís Antonio Barroso é o novo presidente do STF. Em seu excelente livro Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática ele deixa claro que a função da Política e a função do Direito são, em essência, exercícios que podem se entrelaçar, e, ao mesmo tempo, não são exercícios que devam se confundir, um com o outro, porque é ruim para a sociedade que se coloquem a serviço dos caprichos de quem está no poder. Existe, assim, uma tênue fronteira a separar republicanamente o Direito da Política. É dessa fina linha divisória que críticos do STF se valem para afirmar, equivocadamente, que a Corte extrapola de seu papel de Poder Judiciário e desrespeita a tripartição dos Poderes quando passa a legislar. Isso se daria, segundo esses mesmos críticos não bem informados, devido à vocação legiferante do tribunal, que estaria invadindo a esfera de competência do Congresso Nacional.
Trata-se de hermenêutica enviesada. Vejamos os fatos: Parlamentares deixam nos escaninhos temas polêmicos que podem desgastá-los junto à população, com a finalidade de estarem de bem com tudo e com todos. Tais temas engavetados seguem, no entanto, pressionando por regulamentações em meio à diuturna dinâmica social. É nesse ponto que o STF, uma vez provocado, tem de pacificar muitas questões. Vale, então, a pergunta: o STF está usurpando a função legislativa daqueles que para isso estão investidos de mandato? A resposta é não. O STF está somente compensando aquilo que deveria ter sido feito pelo Legislativo, mas que o Legislativo não o fez.
Ficaram se acumulando, por exemplo, questões da contemporaneidade do mundo, feito a quantificação que alguém possa portar de maconha para ser legalmente considerado aquém da linha do tráfico e ser classificado como usuário. Tal quantidade sempre esteve a critério do delegado de plantão quando a pessoa é detida, constituindo clara inconstitucionalidade. O STF foi provocado a pacificar essa pendência jurídica porque o Legislativo, ao qual caberia tal árdua tarefa, a ela fechou os olhos.
Caso exemplar da paralisação dos legisladores é o marco temporal para demarcação de terras indígenas. O Legislativo nada fez durante décadas, e quando o STF, não de ofício, mas porque foi instado a tomar uma decisão para acalmar o País, decidiu contrariamente ao marco temporal, aí os parlamentares correram e votaram a favor dele. Lula pode vetar a decisão do Congresso, mas o Congresso pode derrubar o veto de lula. Quem precisar elucidar a questão, que bata às portas da Corte! Tudo volta ao ponto zero no País de Giuseppe di Lampedusa. É preciso explicar que não é o STF que está legislando; é o Congresso que não cumpre o seu dever de legislar.
*Antonio Carlos Prado é editor executivo da revista ISTOÉ