As eleições americanas trouxeram uma grande frustração para quem valoriza um mundo mais inclusivo, diverso e igualitário. Em um país que já elegeu o primeiro presidente negro, Barack Obama, a eleição de uma mulher negra, além de marcar e lustrar a história, fortaleceria a mensagem de que na democracia americana cabem todos e todos podem apresentarem-se para o sufrágio do voto e serem eleitos, independentemente de cor e raça.
Além disso, num tempo de polarização e conflituosidade, onde a governança carece de diálogo, empatia e contenção, a presença de uma mulher no poder poderia oferecer um olhar mais sensível, conciliador, cooperativo e humanitário, como é , em regra, da natureza feminina, para as questões sociais, raciais e humanitárias que o mundo enfrenta.
A derrota da vice presidenta e candidata Kamala Harris é assim uma perda relevante para esses fundamentos. Todavia, aponta um dado importante para nossa reflexão: a maioria retumbante dos negros americanos, 94%, foram às urnas e votaram na candidata negra. Confiaram e de forma consciente e determinada depositam o voto numa lider comunitária.
No Brasil, uma das maiores populações negras do mundo, enfrentamos desafios de outra natureza. Em São Paulo, onde os negros representam 42% da população, a ex-secretária de Cultura, Aline Torres, uma mulher negra aguerrida, articulada e largamente representativa dos negros paulistanos teve apenas 15 mil votos. Em Salvador, em que os negros respodem por 85% dos eleitores, o candidato negro à prefeitura teve uma votação inexpressiva. Por que ainda temos tanto receio e restrição em votar e eleger lideranças políticas negras? O que nos impede ? O que nos cerceia ?
Neste mês da Consciência Negra, precisamos aproveitar a oportunidade para refletir sobre como o racismo estrutural segue influenciando as decisões eleitorais, e também, fazer uma profunda e honesta autocrítica.Tem um problema de profundidade da alma negra que precisamos ter coragem e disposição para solucionar.
Eleger pessoas negras para cargos de poder é um ato de responsabilidade e compromisso profundo com a comunidade , com o equilíbrio e com a justiça social. Para isso será indispensável superarmos o preconceito, a dubiedade e a descrença, e construirmos um futuro onde todas as vozes, historicamente silenciadas, possam ser ouvidas e respeitadas.
A derrota de Kamalla deve nos inspirar e estimular nesaa direção.
Dr. José Vicente – Reitor da Universidade Zumbi dos Palmares